Do blog da prima
Roberta Iunes, http://www.casamentobetaeivan.blogspot.com/
reproduzimos trecho da crônica do
jornalista e primo Ivan Iunes, publicada hoje no
Correio Braziliense.
"Na madrugada de 9 para 10 de dezembro de 1910, o Rio de Janeiro vivia em estado de quase convulsão social. A reação do governo da então capital federal sufocava a tiros de canhão o último levante relacionado à Revolta da Chibata, na Ilha das Cobras, dentro da Baía de Guanabara. Em meio a uma cidade dividida, o médico José da Graça Mello foi chamado às pressas para o chalé da Rua Teodoro da Silva, em Vila Isabel. O parto, complicado pela bacia estreita da mulher, só foi resolvido com a ajuda de outro médico, Heleno Brandão. Um fórceps mal executado acabou por fraturar o lado direito do maxilar do bebê, que dias depois recebeu o nome de Noel de Medeiros Rosa.
Nas primeiras décadas do século XX, o samba, como retrato do próprio Rio de Janeiro, poderia ser considerado um ritmo partido. Foi no morro do Estácio, espremido entre o samba de roda e o maxixe que teve gênese o samba contemporâneo. A reinvenção do gênero, no entanto, só ganhou o asfalto, poesia e o lirismo atuais a partir do protagonista principal do chalé da Teodoro da Silva.
Nascido há exato um século, foi apenas a partir dos anos 1950 que a obra de Noel Rosa se fez perene a partir de regravações de Aracy de Almeida, uma de suas intérpretes favoritas. A obra do compositor branco, de classe média, mirrado, com apenas sete anos de produção intelectual até o seu desaparecimento em 1937, percorreu um purgatório de 13 anos até que, redescoberta, o transformou no mais influente letrista da história da música brasileira.
Figura controversa, escorregadia, amante da boemia, das zonas de meretrício e da velha Lapa, avesso à luz do dia, porque “levava as morenas embora”, Noel Rosa jogou todo seu talento em sete anos de produção. Cercou-se de pouco mais de 60 parceiros, entre os quais Antônio Nassera, Cartola, Ismael Silva, Wilson Batista e o mais produtivo deles, Vadico, com quem compôs sua obra prima “O Último Desejo”, além de “Feitio de Oração” e outras.
Deixou um legado de 252 composições, fora parcerias que não assinou pelo que chamava de “nossa amizade”. Produziu uma obra atemporal, tão irônica quanto lírica, com temas até hoje atuais, como a invasão cultural norte-americana. “Até Noel, a lírica musical brasileira era parnasiana, idílica e o amor, algo inatingível. Ele vulgariza isso tudo, trazendo inclusive o amor para uma linguagem cotidiana, coloquial, extremamente moderna. Ele entende o modernismo mais do que boa parte dos modernistas”, explica o pesquisador André Diniz.
Em uma era onde o rádio e a mídia eram incipientes, soube cultivar polêmicas e, no rastro delas, se eternizar. Somente para a inspiração do primeiro sucesso, a paródia do Hino Nacional “Com que Roupa”, inventou um par de histórias diferentes – da mão que havia escondido suas roupas para que não saísse à noite até uma canção política, sobre o estado do país na época, uma nação de “tanga” como gostava de dizer. Da mesma forma, trava um duelo musical com Wilson Batista, amplamente divulgado e motivado por ciúmes da mesma Ceci que, além de inspirar “O último desejo”, também o levou compor “A dama do cabaré”. Ao morrer, deu início ao final da era de ouro da música brasileira, que nunca mais teria o mesmo vigor."
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VIVOVERSO presta com o autor sua homenagem ao grande POETA DA VILA, quando completaria 100 anos.
...Que tal deixar pra nós nos comentários alguns versos de Noel?